Situado entre o azul e o amarelo, o verde é o resultado de suas interferências cromáticas. Mas entra, com o vermelho, num jogo simbólico de alternâncias. Uma flor vermelha desabrocha entre folhas verdes. O verde, valor médio, mediador entre o calor e o frio, o alto e o baixo, equidistante do azul celeste e do vermelho infernal — ambos absolutos e inacessíveis — é uma cor tranquilizadora, refrescante, humana.
A cada primavera, depois de o inverno provar ao homem de sua solidão e sua precariedade, desnudando e gelando a terra que ele habita, esta se reveste de um novo manto verde que traz de volta a esperança e ao mesmo tempo volta a ser nutriz. O verde é cálido. E a chegada da primavera manifesta-se através do derretimento dos gelos e das quedas de chuvas fertilizadoras.
O verde é a cor do reino vegetal se reafirmando, graças às águas regeneradoras e lustrais quais o batismo tem todo o seu significado simbólico. O verde é o despertar das águas primordiais, o verde é o despertar da vida.
Vishnu, que carrega o mundo, é representado sob a forma de tartaruga de cara verde e o corpo da deusa indiana da matéria filosofal que nasce do mar de leite, é verde, assim como a Vênus de Fídias.
Winkermann escreve que "se a figura de Netuno tivesse chegado até nós em pintura, ele teria uma roupa verde-mar ou verde-claro, como eram pintadas as Nereidas; enfim, tudo o que fosse relacionado aos deuses marinhos, até os que lhes eram sacrificados, trazia pequenas faixas verde-mar. É por isso que os poetas imaginam os rios com cabelos dessa cor. Em geral, nas pinturas antigas, as ninfas — cujo nome vem da Nymphi, Lympha — também aparecem vestidas de água".
O verde é cor de água, en contraponto ao vermelho que é a cor do fogo, e é por essa razão que o homem sentiu, instintivamente, que as relações entre essas duas cores são análogas às de sua essência e existência.
O verde está ligado ao raio. Corresponde na China, ao trigrama tch'en que é abalo (manifestação quanto da natureza na primavera), o trovão, signo do início da ascensão de yang, corresponde também ao elemento Madeira.
É a cor da esperança, da força, da longevidade (e, por lado, também da acidez). É a cor da imortalidade universalmente simbolizada pelos ramos verdes. O desencadear da vida parte do vermelho e desabrocha no verde.
Os antigos nativos bambaras, os dogons e os mossis consideram o verde uma cor secundária, oriunda do vermelho. Nessa representação muitas vezes se vê a da complementação dos sexos: o homem fecunda a mulher, a mulher alimenta o homem; o vermelho é uma cor masculina, o verde uma cor feminina.
No pensamento chinês é o yin e o yang, o primeiro, masculino, impulsivo, centrífugo e vermelho; o segundo, fe-minino, reflexivo, centrípeto e verde; o equilíbrio de um e outro é todo o segredo do equilíbrio entre o homem e a natureza.
Diante dessa dialética oriental, as nossas sociedades, fundamentadas no culto do princípio masculino, sempre deram prioridade à faísca criadora, venha ela dos rins ou do cérebro do homem. É a chispa espanhola, fundamento de toda uma ética. Em contrapartida, ela leva ao complexo de Édipo, ou seja, ao culto do refúgio materno.
Ao final de um galope furioso, o homem — essencialmente filho e amante — volta para a Mãe como para um oásis, é o porto da paz, refrescante, revigorante. A partir desse fato, existe toda uma terapêutica do verde baseada, mesmo quando ela própria o ignora, no regressus ad uterum.
Na Idade Média a toga dos médicos era verde por usarem plantas medicinais; nos dias de hoje a cor verde foi substituída pelo vermelho escuro que, intuitivamente, exprime a crença no segredo da arte médica; mas o verde continuou a ser a cor dos farmacêuticos, que elaboram os remédios, e também dos enfermeiros em alguns hospitais e sistemas de saúde.
E a publicidade farmacêutica soube trazer de volta uma velha crença dando um valor mítico de panaceia a palavras como clorofila ou vitaminas. A expressão ficar verde, nascida da hipertensão provocada pela vida urbana, também exprime a necessidade de uma volta periódica a um ambiente natural, o que faz do campo um substituto da mãe.
O diário de um esquizofrênico citado por Durand mostra isso de maneira indiscutível: 'Senti-me, escreve o doente, próximo da cura, entrando numa paz maravilhosa. Tudo no quarto era verde. Pensei estar num charco, o que, para mim, equivalia a estar dentro do corpo da mãe... Eu estava no Paraíso, no seio materno".
O verde — envolvente, tranquilizante, refrescante e tonificante — é celebrado nos monumentos religiosos erigidos no deserto por nossos ancestrais.
Para os cristãos, a Esperança, virtude teologal, permanece verde. Mas o cristianismo desenvolveu-se em climas temperados, onde a água e a verdura tornaram-se banais. Totalmente diferente é o caso do islamismo, cujas tradições criaram-se como miragens, acima da imensidão hostil e ardente dos desertos e das estepes.
Acima a bandeira da Arábia Saudita e sua cor predominante verde. A mensagem de texto exibida sobre o símbolo da espada pode ser traduzido para o português como "Não há Deus senão Alá, e Maomé é o seu mensageiro".
As bandeiras dos países Islâmicos tem três elementos em comum: a cor, os símbolos e as inscrições. Na maior parte das bandeiras islâmicas, o verde é a cor predominante. Representa o Islã e, por isso, marca a sua tonalidade. A segunda característica, os símbolos, são também um elemento de destaque. A estrela, a meia-lua e figuras com cinco pontas representam, também, a comunidade islâmica bem como os pilares fundamentais pelos quais se organizam. Ao nível das inscrições em texto árabe, palavras como “Allah” ou “Allah u Akbar”, que são, respetivamente, “Deus” e “Deus é grande”, encontram-se inscritas nas bandeiras. O primeiro pilar do Islã, o Ash-Shahadah, também é frequentemente encontrado.
A bandeira do Islã é verde, e essa cor constitui para o muçulmano o emblema da Salvação, o símbolo das mais elevadas riquezas, materiais e espirituais, a primeira das quais é a família: diz-se que era verde o manto do Enviado de Deus, sob o qual seus descendentes diretos — Fátima, a filha, Ali, o genro e seus dois filhos, Hassan e Hussein — vinham refugiar-se na hora do perigo, razão por que são chamados de os quatro debaixo do manto: os quatro significa também os quatro pilares sobre os quais Maomé construiu sua igreja. E os nômades, à noite, depois da última oração, evocam a maravilhosa história de Khidr, Khisr ou Al Khadir, O Homem Verde.
Khisr é o patrono dos viajantes, encarna a providência divina. Segundo a tradição, ele construiu sua casa no ponto extremo do mundo, onde se tocam os dois oceanos, terrestre e celeste: representa, portanto, esta medida da ordem humana, equidistante do Alto e do Baixo.
Aquele que encontra Khisr não deve questioná-lo, mas deve submeter-se a seus conselhos, por mais extravagantes que possam parecer. Pois Khisr, como todo verdadeiro iniciado, indica o caminho da verdade sob aparências por vezes absurdas. Nesse sentido, Khisr é parente próximo do Companheiro de estra-da de Andersen, e, como ele, desaparece depois de ter prestado auxílio.
Sua origem é incerta. De acordo com algumas versões, seria o próprio filho de Adão, o primeiro dos profetas, e teria salvado o cadáver do pai do dilúvio. De acordo com outras, ele teria nascido numa grota — isto é, da vagina da própria terra — e teria sobrevivido e crescido graças ao leite de um animal, antes de alistar-se ao serviço de um Rei — que não pode ser outro senão Deus ou o Espírito. Às vezes é confundido com São Jorge e, frequentemente, com Elias — o que vem reafirmar o parentesco entre o verde e o vermelho, da água e do fogo.
Conta-se que um dia, quando caminhava no deserto com um peixe seco na mão, descobriu uma fonte. Mergulhou o peixe na água e este imediatamente voltou à vida; Khisr compreendeu, então, que havia descoberto a fonte da vida; banhou-se nela e assim tornou-se imortal, enquanto o seu manto coloriu-se de verde.
Ele é frequentemente associado ao oceano primordial; diz-se que mora numa ilha invisível, no meio do mar. Tornou-se, em consequência, o patrono dos navegadores, que os marinheiros da Síria invocam quando são surpreendidos por uma tempestade.
O verde na Índia
Na Índia, onde é venerado com o nome de Khawdja Khidr, é representado sentado num peixe, e é equiparado aos deuses dos rios. Mas necessariamente reina sobre a vegetação e sobre as águas.
Certos cronistas árabes dizem que ele "se senta numa pele branca e que esta fica verde; essa pele", acrescenta um observador, é a terra. Os sufistas dizem que o Khisr também protege o homem "do afogamento e do incêndio, dos Reis e dos Diabos, das serpentes e dos escorpiões".
É, portanto, claramente o mediador, aquele que concilia os extremos, que resolve os antagonismos fundamentais para assegurar o desenvolvimento do homem.
Os santos, em sua morada paradisíaca, vestem-se de verde. Benéfico, o verde reveste-se, portanto, de um valor mítico, o das "green pastures", dos paraísos verdes dos amores infantis: também verde, como a juventude do mundo, é a juventude eterna prometida aos Eleitos.
O verde e sua simbologia no norte da Europa
A verde Erin, antes de tornar-se o nome de Irlanda, era o da ilha dos bem-aventurados do mundo celta.
Os místicos alemães (Matilde de Magdeburgo, Angelus Sile-sius) associam o verde ao branco para qualificar a Epifania e as virtudes cristãs, a justiça do verde vindo completar a inocência do branco.
A sinople, ou verde do escudo, tem a mesma origem pastoral: de acordo com Sicille, "O escudo de cores" (séc. XV), citado por Littré, "significa bosques, prados, campos e verdura, ou seja, civilidade, amor, alegria e abundância. Os arcebispos usam um chapéu sinople com cordões verdes entrelaçados... os bispos também usam o chapéu sinople, pois, tendo sido indicados pastores dos cristãos, essa cor denota bons pastos para onde os sábios pastores conduzem as suas ovelhas, e é o símbolo da boa doutrina desses prelados".
Essas maravilhosas qualidades do verde levam a pensar que essa cor esconde um segredo, que ela simboliza um conhecimento profundo, oculto, das coisas e do destino. A palavra sinople vem do latim sinopis, que designava, inicialmente, a terra vermelha de Sinope, antes de tomar, no séc. XIV, o sentido de verde, por razões inexplicadas, e que significava simultaneamente vermelho e verde.
E, provavelmente, é essa a razão por que os anônimos codificadores da linguagem das armas falantes escolheram essa palavra. A virtude secreta do verde vem do fato de ele conter o vermelho, da mesma forma que, usando a linguagem dos hermetistas e dos alquimistas, a fertilidade de toda obra provém do fato de o princípio ígneo — princípio quente e masculino — animar o princípio úmido, frio, feminino.
Em todas as mitologias, as divindades verdes da primavera hibernam nos infernos onde o vermelho ctoniano as regenera. Por isso, são exteriormente verdes e interiormente vermelhas (assim como uma melancia), e seus domínios estendem-se sobre os dois mundos.
A cor verde no antigo Egito
Osíris, o verde, foi despedaçado e jogado no Nilo. ressuscita graças à magia de Ísis, a vermelha. É um Grande Iniciado, pois conhece o mistério da morte e do renascimento. Por isso, preside simultaneamente na terra à renovação da primavera e, sob a terra, ao julgamento das almas.
Perséfone aparece na terra na primavera, com os primeiros brotos dos campos. No outono volta aos infernos. aos quais está presa para sempre desde que comeu uma semente de granada. Essa semente de granada é o seu coração, parcela do fogo interior da terra que condiciona toda regenerescência: é o vermelho interno da Perséfone verde.
O mito asteca da deusa Xochiquetzal, que, como Perséfone, foi raptada e levada aos infernos durante a estação de inverno, apresenta uma analogia intrigante com o mito grego; ela desaparece no Jardim do Oeste, isto é, na região dos mortos, para reaparecer na primavera, quando preside ao nascimento das flores.
É possível identificá-la nos manuscritos por "seu duplo penacho de plumas verdes, o omoquetzalli, que usa como enfeite". O verde e o vermelho, para os astecas, são também os chalchihuitl, pedras preciosas verdes que ornamentam a saia da deusa das águas, e o chalchihuatl, ou água preciosa, nome dado ao sangue que saía do coração das vítimas que os sacerdotes do Sol imolavam toda manhã ao astro do dia, para alimentar a sua luta contra as trevas noturnas e garantir a sua regeneração.
Necessariamente encontramos a mesma complementação do verde e do vermelho nas tradições relativas às divindades do amor.
Afrodite, que surgiu das espumas das ondas, fica dividida entre a atração de dois princípios masculinos — o esposo, Hefestos, fogo ctoniano, e o amante Ares, fogo uraniano; no dia em que Hefestos surpreende os amantes abraçados é Poseidon, deus das águas, que intervém em favor de Afrodite.
E não terá sido, sem dúvida, por outras razões que os pintores da Idade Média pintavam a cruz de verde — o instrumento da regeneração do gênero humano através do sacrifício de Cristo. Em Bizâncio (atual Istambul), a cor verde era simbolizada pelo monograma do Cristo Redentor, formado por duas consoantes da palavra verde. Por essa razão, a luz verde toma uma significação oculta.
Os egípcios temiam os gatos de olhos verdes e puniam com a morte aquele que os matasse.
Na tradição órfica, o verde é a luz do espírito que fecundou no início dos tempos as águas primordiais, até então envoltas em trevas.
Para os alquimistas é a luz da esmeralda que penetra os maiores segredos. A partir disso é possível compreender o ambivalente significado do raio verde: se ele é capaz de tudo atravessar, é portador tanto de morte quanto de vida. Pois, e é aqui que a valorização do símbolo se inverte, ao verde dos brotos primaveris opõe-se o verde do mofo, da putrefação — existe um verde de morte, assim como um de vida. O verde da pele do enfermo opõe-se ao verde da maçã, e, embora as rãs e as lagartas verdes sejam divertidas e simpáticas, o Crocodilo, escancarando a Goela verde, é uma visão de pesadelo, portas dos infernos abrindo-se no horizonte para aspirar a luz e a vida.
O verde possui uma força maléfica, noturna, como todo símbolo feminino. A linguagem o demonstra: podemos ficar verdes de medo ou verdes de frio.
A Esmeralda, que é uma pedra papal, é também a de Lúcifer antes de sua queda. Embora o verde, enquanto medida, fosse o símbolo da razão — os olhos de Minerva — na Idade Média, tornou-se também o símbolo do irracional e o brasão dos loucos.
Essa ambivalência é igual à de todo símbolo ctoniano: Satanás, num vitral da Catedral de Chartres, de pele e olhos arregalados verdes.
Na nossa época, em que, através das descobertas da ciência, o fantástico retoma um significado cósmico, é natural que representemos os marcianos, isto é, o avesso da nossa humanidade, sob a forma de diabos ou de homúnculos verdes, ou dotados de sangue verde, o que se reveste, instintivamente, de um valor de sacrilégio, a exemplo da efusão de sangue, tão grande é o desejo do homem, instintivamente, de que os papéis do que é feito para ser visto e do que é feito para ser escondido jamais se invertam.
Mas a nossa época também celebra o verde, símbolo da natureza naturista, com uma veemência especial desde que a civilização industrial ameaça essa natureza. Dessa forma, o verde dos movimentos ecologistas vem acrescentar ao simbolismo inicial desta cor um tom de nostalgia, como se a primavera da terra fosse desaparecer inexoravelmente sob uma paisagem de pesadelo de cimento e de aço.
E o pintor ecologista Uriburu, depois de ter pintado de verde os canais de Veneza e as fontes de Paris, expõe quadros verdes que representam as espécies animais atualmente ameaçadas de extinção.
Aqui, mais uma vez, percebemos a inversão simbólica subjacente: pois a natureza verde não foi sempre uma imagem de apaziguadora doçura; a Amazônia, pulmão do mundo, que Uriburu e os movimentos ecologistas defendem com justa causa, não faz muito tempo era chamada de inferno verde.
Os alquimistas, na sua busca da resolução dos contrários, talvez tenham ido mais longe do que a nossa imaginação.
Definem seu "fogo secreto, espírito vivo e luminoso", como um cristal translúcido, verde, que se funde como a cera; é ele, diziam, "que a natureza utiliza subterraneamente para todas as coisas que a Arte produz, pois a Arte tem de limitar-se a imitar a natureza".
Esse fogo é o que resolve os contrários: dizem que é "árido, mas que faz chover; úmido, mas que resseca". E por fim, em todos os esoterismos, o próprio princípio vital, o segredo dos segredos, aparece como um sangue profundo contido num recipiente verde. Para os alquimistas ocidentais, é o "sangue do Leão Verde que é o ouro, não dos leigos, mas dos filósofos".
Na filosofia e medicina chinesas é o não menos misterioso sangue do dragão. É também o Graal, vaso de esmeralda ou de cristal verde, portanto do verde mais puro, que contém o sangue do Deus encarnado, no qual se fundem as noções de amor e de sacri-fício que são as condições da regeneração expressa pelo luminoso verdor do vaso, em que, crepúsculo e aurora, morte e renascimento, equilibrando-se, confundem-se.
O verde e o cristianismo
Não há dúvida de que a Idade Média, nesse mito, tenha se inspirado nos textos mais esotéricos do Novo Testamento. São João, no Apocalipse (4, 3), descreve assim a sua visão do Deus supremo que, como a de Ezequiel, não passa de uma epifania de Luzes, sem forma nem rosto: "Aquele que estava sentado tinha o aspecto de uma pedra de jaspe e cornalina, e um arco-íris envolvia o trono com reflexos de esmeralda."
Essa visão de esmeralda é provavelmente a origem do Graal; ela envolve, encerra, é o vaso, fêmea. E a luz divina que contém como a própria essência da divindade é dupla em uma, ao mesmo tempo de um verde de jaspe e de um vermelho escuro e profundo de cornalina.
Ao interpretar esses dois aspectos essenciais do verde, cor natureza e fêmea, os especialistas modernos da comunicação e do marketing concluíram, depois de testes e sondagens, que o verde era a cor mais calma que existe, uma cor sem alegria, sem tristeza, sem paixão, que nada exige. "O verde é, na sociedade das cores, o que a burguesia é na dos homens: um mundo imóvel, satisfeito, que mede os seus esforços e conta o seu dinheiro".
E a sua oscilação entre o dia e a noite, a germinação e a putrefação, o pêndulo parado no ponto zero da balança: a paz do verde seria a paz da neutralidade.
É também o verde de justiça de Angelus Silesius citado anteriormente. Mas os mesmos especialistas especificam que se trata do verde puro, que qualquer acréscimo de um pigmento estranho, por mais leve que seja, elimina a sua neutralidade para trazê-lo de volta à agitação da nossa sociedade: "uma ponta de amarelo lhe dá uma força ativa, um aspecto ensolarado. Se o azul domina, o verde torna-se sério e carregado de pensamento. Claro ou escuro, o verde conserva o seu caráter original de indiferença e de calma; no verde-claro predomina a indiferença; enquanto a calma se faz mais sentir no verde-escuro".
Deveríamos então concluir, como Herve Fischer na sua reflexão sobre a obra de Uriburu: "Entre a integração ao sistema ideológico dominante (um verde compensador do artificio urbano), a contestação ideológica e o mercado, me pergunto se o verde não vai perder o seu antigo significado simbólico religioso que o identificava à esperança?".
Não há dúvida de que o vaso, mesmo que contenha a mais preciosa embriaguez, é em si neutro, talvez por uma razão de proteção, como o ventre dentro do qual o embrião se desenvolve, princípio vital.
Isso viria ao encontro de todas as tradições esotéricas em que o princípio vital, segredo dos segredos, aparece como um sangue profundo, contido num recipiente verde.
A linguagem dos símbolos, ao mesmo tempo viva e esotérica, como a língua verde, não é feita para fechar portas, mas para abri-las à reflexão. Está intimamente ligada à vida infinita dos sentimentos e pensamentos, o que a diferencia de nossas tentativas de trabalho com a psicologia aplicada que atende a algo finito e preciso.
Muitas vezes o que essa profunda língua diz só é percebido a posteriori, criando, através dos séculos e das civilizações, diálogos inesperados.
Os curandeiros astecas, para curar males do peito, pronunciavam a seguinte invocação: "Eu, Sacerdote, Eu, Senhor dos encantamentos, procuro a dor verde, procuro a dor russa".
Muitos séculos depois, Van Gogh escreveu: 'Procurei exprimir com o vermelho e o verde as terríveis paixões humanas".
São João Evangelista, o sacerdote asteca e Van Gogh só tinham em comum uma única qualidade: a de inspirados. O verde conserva um caráter estranho e complexo, que provém da sua polaridade dupla: o verde do broto e o verde do mofo, a vida e a morte. É a imagem das profundezas e do destino.
Fonte: Livro Dicionário dos Símbolos, por Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, editora J.O.