O olho, órgão da percepção visual, é, de modo natural e quase universal, o símbolo da percepção intelectual. É preciso considerar, sucessivamente, o olho físico, na sua função de recepção da luz; o olho frontal— o terceiro olho de Shiva; enfim o olho do coração. Todos os três recebem a luz espiritual.
Aquele que tem olhos é a designação expressa, entre os esquimós, do xamã, o clarividente. Tanto no Bhagavad-Gita como nos Upanixades, os dois olhos são identificados com os dois luzeiros: o Sol e a Lua; são os dois olhos de Vaishvanara. Da mesma forma, o Sol e a Lua são, no taoismo, os dois olhos de P'anku ou de Lao-kium; no Xintô, os de Izanagi.
Tradicionalmente, o olho direito (Sol) corresponde à atividade e ao futuro, o olho esquerdo (Lua) à passividade e ao passado. A resolução dessa dualidade faz passar da percepção distintiva à percepção unitiva, à visão sintética.
O caractere chinês ming (luz) é a síntese dos caracteres que designam o Sol e a Luz: "Meus olhos representam o caractere ming", lê-se num ritual de sociedade secreta. Essa percepção unitiva é a função do terceiro olho, o olho frontal de Shiva.
Se os dois olhos físicos correspondem ao Sol e à Lua, o terceiro olho corresponde ao fogo. Seu olhar reduz tudo a cinzas, isto é, exprimindo o presente sem dimensões, a simultaneidade, ele destrói a manifestação.
É o Prajnachaksus (olho da sabedoria) ou Dharma-chaksus (olho do Dharma) dos budistas, que, situado no limite entre a unidade e a multiplicidade, entre a vacuidade e a não vacuidade, permite que essas sejam apreendidas simultaneamente. É, de fato, um órgão da visão interior, e portanto uma exteriorização do olho do coração.
Essa visão unificadora exprime-se ainda no Islã pela superação dos dois olhos da letra ha, cujo desenho árabe comporta efetivamente dois círculos, símbolos da dualidade, da distinção.
O terceiro olho indica a condição sobre-humana, aquela em que a clarividência atinge sua perfeição, bem como, de forma mais elevada, a participação solar. A visão dualística é igualmente uma percepção mental: "a alma tem dois olhos", escreve Silesius; "um olha o tempo, o outro está voltado para a eternidade".
Segundo os vitorinos, um é o amor, o outro, a função intelectual. Concebe-se, aqui também, que a visão interior deva unificar essas dualidades.
Segundo Platão e São Clemente de Alexandria, o olho da alma é não apenas único, mas desprovido de mobilidade; só é suscetível, portanto, de uma percepção global e sintética.
A mesma expressão olho do coração ou do espírito pode ser assinalada em Plotino, Santo Agostinho, São Paulo, São João Clímaco, em Filoteu, o Sinaíta, Elias, o Édico, São Gregório de Nazianzo; é ainda uma constante da espiritualidade muçulmana (ayn-el-Qalb), onde é encontrada na maioria dos sufistas, especialmente em Al-Hallaj. M. Schuon observou-a de modo semelhante entre os sioux.
O olho do coração é o homem vendo Deus, mas também Deus vendo o homem. É o instrumento da unificação de Deus e da alma, do Princípio e da manifestação. O olho único, sem pálpebra, é, por outro lado, o símbolo da Essência e do Conhecimento divino.
Inscrito num triângulo, é, nesse sentido, um símbolo ao mesmo tempo maçônico e cristão. Observou-se sua existência na trinacria armênia. O caodaísmo vietnamita adotou-o tal qual, fazendo dele o selo que lacra a investidura celeste dos Eleitos.
O olho único do Ciclope indica, ao contrário, uma condição subumana, o mesmo acontecendo com a multiplicidade dos olhos de Argos: dois, quatro, cem olhos, dispersos por todo o corpo, que nunca se fecham todos ao mesmo tempo, o que significa a absorção do ser pelo mundo exterior e uma vigilância sempre voltada para fora.
O olho humano, como símbolo de conhecimento, de percepção sobrenatural, possui às vezes particularidades espantosas. Entre os fueguinos, ele sai do corpo — sem, entretanto, separar-se dele — e se dirige espontaneamente para o objeto da percepção; entre os Imortais taoistas, possui uma pupila quadrada.
A abertura dos olhos é um rito de abertura ao conhecimento, um rito de iniciação. Nas culturas indígenas, abrem-se os olhos das estátuas sagradas para vivifica-las; em outras culturas, abrem-se os olhos das máscaras; no Vietnã, abre-se a luz a um junco (barco) novo, entalhando-se ou pintando-se dois grandes olhos na sua proa.
O olho divino que tudo vê é ainda representado pelo Sol: é o olho do mundo, expressão que corresponde a Agni e que também designa o Buda.
O olho do mundo é o buraco no alto do domo, porta do sol; o olhar divino que abraça o cosmo, mas igualmente a passagem obrigatória para a saída do cosmo.
O olho correspondente ao fogo é relacionado com a função contemplativa de Amitabha. Seu trono é sustentado pelo pavão, cujas plumas são semeadas de olhos. Deve-se observar que o olho é às vezes utilizado como símbolo do conjunto das percepções exteriores, e não apenas da visão.
Entre os egípcios, o olho Udjat (olho pintado) era um símbolo sagrado, que se encontra em quase todas as obras de arte. Era considerado uma "fonte de fluido mágico, o olho-luz purificador".
Conhece-se também a importância do falcão na arte e na literatura religiosa do Egito Antigo. "Os egípcios se impressionaram com a mancha estranha que existe sob o olho do falcão, olho que tudo vê; e, em torno do olho de Hórus, desenvolve-se toda uma simbólica da fecundidade universal".
Rá, o deus Sol, era dotado de um olho incandescente, símbolo da natureza ígnea; era representado por uma serpente erguida, de olho dilatado, chamada uraeus (ureu). Os sarcófagos egípcios são frequentemente ornados com um desenho de dois olhos, que, acreditava-se, permitiam que o morto observasse, sem se deslocar, o espetáculo do mundo exterior.
Em todas as tradições egípcias, o olho se revela como sendo de natureza solar e ígnea, fonte
de luz, de conhecimento e fecundidade.
É uma concepção que se reencontrará, transposta, em Plotino, o filósofo alexandrino, neoplatônico, do século II depois de Cristo, para quem o olho da inteligência humana não podia contemplar a luz do Sol (espírito supremo) sem participar da própria natureza desse Sol-espírito.
A palavra 'ayn, que significa olho, pode também designar, na tradição do Islã, uma entidade particular, uma fonte ou uma essência. O caráter universal de uma coisa é frequentemente indicado na mística e na teologia por esse termo.
Segundo os místicos e os filósofos com laivos de neoplatonismo, os universais existem eternamente no Espírito de Deus; essas ideias eternas correspondem às Ideias ou Arquétipos de Platão: são como olhos.
Para os místicos, nosso mundo não passa de um sonho; o mundo e a realidade verdadeiros se encontram no Uno divino; Deus é a única verdadeira fonte real e última, de onde surgem todas as coisas. Emprega-se, pois, 'ayn (olho) no seu duplo sentido de real e de fonte, para indicar a existência superior da mais profunda essência de Deus. Observa-se esse sentido em Avicena, que fala dos que penetram até o 'ayn, contemplação da natureza íntima de Deus.
Finalmente, pode-se notar que o termo 'ayn ul-yaquin, contemplação da certeza, que é um dos graus do conhecimento, é às vezes empregado no sentido de intuição, segundo uma dupla acepção: sentido pré-racional da compreensão intuitiva dos primeiros princípios filosóficos, e sentido pós-racional da compreensão intuitiva da verdade mística suprarracional.
Nas suas múltiplas metáforas, a poesia elegíaca, árabe e persa, associa o olho às noções de magia, perigo e embriaguez.
O olho da amada é descrito como "um tanto inebriado", ou "ébrio, mas não de vinho". É aquele que "persegue os leões" ou que "captura os leões; é ávido de sangue, assassino"; é também "uma taça, um narciso, uma gazela, uma concha".
O mau-olhado é uma expressão muito comum no mundo islâmico. Simboliza uma tomada de poder sobre alguém ou alguma coisa, por inveja e com uma intenção maldosa.
O mau-olhado é a causa, diz-se, da morte de metade da humanidade. O mau-olhado esvazia as casas e enche as tumbas. Têm olhos particularmente perigosos: as velhas, as jovens recém-casadas.
São especialmente sensíveis a ele: as crianças, as parturientes, as jovens recém-casadas, os cavalos, os cães, o leite, o trigo. O indivíduo que possui o mau-olhado é chamado, em árabe, de ma'ian. Quando o ma'ian olha com desejo para alguma coisa (objeto ou homem que lhe agrada), causa um dano àquele que ele fita.
A questão de saber se seu olho descarrega sobre o objeto alguma substância invisível, como o veneno que se destaca do olho da víbora, ainda não está resolvida, é apenas algo provável.
O olho de certos animais é temido, como por exemplo a víbora. O mau-olhado pode fazer o gado morrer. Eu me refugio perto de Deus contra o mal que faz o invejoso, quando a inveja toma conta dele.
O Profeta disse: "O 'ayn (olho) é uma realidade. ". Existem meios de defesa contra o mau-olhado: véu, desenhos geométricos, objetos brilhantes, fumigações odoríferas, ferro vermelho, sal, alúmen, chifres, crescente, mão de Fatma.
A ferradura é também um talismã contra o mau-olhado; parece reunir, por causa de sua matéria, de sua forma e de sua função, as virtudes mágicas de diversos símbolos — chifre, crescente, mão —, e as do cavalo, animal doméstico e primitivamente sagrado.
Nas tradições da Europa do Norte, existe um rei zarolho e vidente, Eochaid, rei de Connaught, que dá seu único olho ao malvado druida de Ulster, Aithirne. Vai, depois, purificar-se numa fonte; mas, em recompensa por sua generosidade, Deus lhe restitui os dois olhos.
O deus Mider, que também perdeu seu olho numa rixa, não pode mais reinar, porque a cegueira o desqualifica. Os responsáveis, Oengus e seu pai, o Dagda (Apoio e Júpiter), fazem então vir o deus-médico Diancecht (aspecto do Apoio-médico), que dá ao paciente o uso de seu olho.
Mas, segundo a legislação irlandesa, Diancecht tem direito a uma indenização, e ele pede: um carro, um manto e a mais bela jovem da Irlanda, Etain (personificação da Soberania). Como castigo por seu adultério com o Dagda, Boand, mãe de Oengus, vê-se roubada de um olho, um braço e uma perna pela água da fonte de Segais, aonde fora purificar-se.
O olho aparece aqui como uma equivalência simbólica da consciência soberana. O erro (cólera, violência, adultério) cego e a cegueira impedem alguém de reinar; ao contrário, a generosidade ou a confissão tornam a pessoa clarividente.
Por outro lado, o olho é um equivalente simbólico do Sol, e o termo irlandês sul, olho, corresponde ao nome bretão do Sol.
Em gálico, o sol é chamado por metáfora olho do dia (Ilygad y dydd). Numerosas moedas gaulesas apresentam uma cabeça de herói com o olho desmesuradamente aumentado. Um cognome de Apolo, atestado por uma única inscrição galo-romana, é Amarcolitanus com longo olho na cabeça, e a expressão com longo olho na cabeça (rose Imlebur inachind) é frequente nos textos irlandeses.
Em contrapartida, o olho único das personagens inferiores da série dos fomoiré é maléfico: o olho de Balor paralisa todo um exército, e é preciso desviá-lo com um gancho, exatamente como o do gálico Yspaddaden Penkawr.
A rainha Medb transforma os filhos de Caltin em feiticeiros, fazendo-os passar por mutilações anti-iniciáticas: ela os torna zarolhos do olho esquerdo.
Todas as feiticeiras que aparecem nas lendas insulares são zarolhas do olho esquerdo. A cegueira é um símbolo ou um signo de vidência, e existem druidas ou adivinhos que são cegos.
Para os bambaras, o sentido da visão é o que resume, que substitui todos os outros. O olho, de todos os órgãos dos sentidos, é o único que permite uma percepção com um caráter de in-tegralidade.
A imagem percebida pelo olho não é virtual, constitui uma cópia, um duplo, material, que o olho registra e conserva. Durante o ato sexual, "a mulher se une a seu marido pelos olhos e pelo sexo".
Os bambaras dizem: a visão é o desejo; o olho é a cobiça; e o mundo do homem é seu olho. Por isso, metaforicamente, o olho pode abranger as noções de beleza, luz, mundo, universo, vida.
Na África central, a importância atribuída ao sentido da visão é atestada pela utilização muito frequente de olhos de animais ou humanos nos produtos mágicos, misturados pelos adivinhos, para os ordálios.
Em Kasai, os mágicos Baluba e Iulua utilizam os olhos e o focinho do cachorro da vítima, para desmascarar o feiticeiro responsável por uma morte suspeita.
No Gabão, os membros das sociedades dos homens-panteras tiravam, em primeiro lugar, os olhos de suas vítimas.
Na tradição maçônica, o olho simboliza, "no plano físico, o Sol visível de onde emanam a Vida e a Luz; no plano intermediário ou astral, o Verbo, o Logos, o Princípio criador; no plano espiritual ou divino, o Grande Arquiteto do Universo".
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Fonte: Livro Dicionário dos Símbolos, por Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, editora J.O.