Os símbolos apresentam certa constância na história das religiões, das sociedades e do psiquismo individual. Estão ligados a situações, pulsões e conjuntos análogos. Evoluem de acordo com os mesmos processos.
Esse artigo foi publicado a partir da apresentação do livro DICIONÁRIO DOS SÍMBOLOS, e nesse artigo serão tratados os vários aspectos e conceitos ligados aos SIMBOLOS religiosos, sociais e pessoais. Hoje em dia, os símbolos gozam de nova aceitação. A imaginação já não é mais desprezada como a louca da casa. Ela está reabilitada, considerada gêmea da razão, inspiradora das descobertas e do progresso.
Deve-se essa aceitação, em grande parte, às antecipações da ficção que a ciência comprova pouco a pouco, aos efeitos da dominação atual da imagem que os sociólogos estão tentando medir, às interpretações modernas dos mitos antigos e ao nascimento de mitos modernos, e as lúcidas explorações da psicanálise.
Os símbolos estão no centro, constituem o cerne dessa vida imaginativa. Revelam os segredos do inconsciente, conduzem às mais recônditas molas da ação, abrem o espírito para o desconhecido e o infinito. Ao longo do dia e da noite, em nossa linguagem, nossos gestos ou nossos sonhos, quer percebamos isso ou não, cada um de nós utiliza os símbolos.
Eles dão forma aos desejos, incitam a empreendimentos, modelam comportamentos, provocam êxitos ou derrotas. Sua formação, seu agenciamento e sua interpretação são do interesse de diversas disciplinas:
- a História das Civilizações;
- a história das Religiões;
- a Linguística;
- ao Marketing;
- a Antropologia Cultural;
- a Crítica de Arte;
- a Psicologia;
- a política;
- a Medicina.
Hoje, já não se pode deixar de reconhecer realidades tão atuantes. Todas as ciências do homem e todas as artes, bem como as técnicas que delas procedem, deparam-se com símbolos em seu caminho.
Devem conjugar esforços para decifrar os enigmas que esses símbolos propõem; associam-se para mobilizar a energia condensada que neles se encerra. Seria dizer pouco que vivemos num mundo de símbolos — um mundo de símbolos vive em nós.
A expressão simbólica traduz o esforço do homem para decifrar e subjugar um destino que lhe escapa através das obscuridades que o rodeiam.
Capítulo 1: Um quadro de orientação, não um conjunto de definições
Por força de seu próprio objetivo, este artigo não pode ser um conjunto de definições, como os léxicos ou vocabulários usuais. Pois um símbolo escapa a toda e qualquer definição. É próprio de sua natureza romper os limites estabelecidos e reunir os extremos numa só visão.
Assemelha-se à flecha que voa e que não voa, imóvel e fugitiva, evidente e inatingível. As palavras serão indispensáveis para sugerir o sentido ou os sentidos de um símbolo; mas elas são incapazes de expressar todo o valor.
Assim, que o leitor não tome nossas breves fórmulas por cápsulas que encerrem em seus estreitos limites todas as dimensões de um símbolo. Este entrega-se e foge; à medida que se esclarece, dissimula-se; segundo palavras de Georges Gurvitch, os símbolos revelam velando e velam revelando.
Na célebre Vila dos Mistérios de Pompeia, que as cinzas do Vesúvio recobriram durante séculos, uma admirável pintura, cor de malva sobre fundo vermelho, evoca a revelação dos mistérios no decurso de uma cerimônia de iniciação.
Os símbolos estão perfeitamente desenhados; os gestos rituais, esboçados; o véu, levantado; mas, para o não iniciado, o mistério permanece inteiro, prenhe de equívocos.
As interpretações de um símbolo são referidas sem nenhum sistema preconcebido; são por vezes agrupadas de acordo com uma ordem dialética, cuja utilidade é tão somente didática ou estética. Raramente são criticadas, salvo quando se afastam de uma certa lógica dos símbolos, da qual falaremos na sexta parte desta introdução; mas essas críticas são elas próprias acompanhadas de reservas, pois à verdade do símbolo pode-se aplicar o título da famosa peça de Pirandello: Assim é, se lhe parece.
Por vezes, acontece-nos adiantar algumas interpretações pessoais. Mas cada parágrafo permanece amplamente em aberto. Apesar do desenvolvimento dado a certos verbetes, nenhum deles pretende ser exaustivo em si mesmo. Sobre cada um dos grandes símbolos, livros inteiros foram escritos, e cobririam várias estantes de uma biblioteca.
Somente analisando a esfera do marketing e do design gráfico, muitos são os livros publicados que exibem seus símbolos comerciais e cada um nos conta uma história diferente, narrada de diferentes pontos de vista.
Outras variações do estudo dos símbolos vem da análise das suas cores, seus impactos e psicologia intrínseca a cada cor.
Devido à natureza de qualquer ciência da área de ciências humanas, esse artigo limitou-se às interpretações que eram ao mesmo tempo as mais seguras, as mais fundamentais, as mais sugestivas, ou seja, àquelas que melhor permitiriam ao leitor descobrir ou pressentir por si mesmo novos significados. Esse trabalho de invenção pessoal e essa possibilidade de percepções originais serão, de resto, facilitados por um jogo de numerosas correspondências entre os verbetes.
Consequentemente, nada mais fácil, para quem o desejar, do que aprofundar e ampliar sua percepção de um símbolo. Na verdade, o leitor imaginativo encontrará nestas páginas mais estímulos do que conhecimentos.
Segundo seu gosto ou sua inclinação, seguirá certa linha de interpretação ou então imaginará outra. Pois a percepção do símbolo é eminentemente pessoal, não apenas no sentido em que varia de acordo com cada indivíduo, mas também no sentido de que procede da pessoa como um todo.
Ora, cada pessoa é, a um só tempo, conquista e dádiva; ela participa da herança biofisiopsicológica de uma humanidade mil vezes milenar; é influenciada por diferenciações culturais e sociais próprias a seu meio imediato de desenvolvimento e, a tudo isso, acrescenta os frutos de uma experiência única e as ansiedades da situação que vive no momento.
O símbolo tem precisamente essa propriedade excepcional de sintetizar, numa expressão sensível, todas as influências do inconsciente e da consciência, bem como das forças instintivas e espirituais, em conflito ou em vias de se harmonizar no interior de cada homem.
Não quisemos dispor as informações reunidas sobre cada palavra numa ordem que fosse científica só na aparência. O estudo geral dos símbolos ainda não está suficientemente avançado, apesar dos excelentes trabalhos que se têm multiplicado nesses últimos anos, para permitir uma teoria capaz de expor de modo satisfatório todos os dados acumulados.
Sem dúvida, algumas leis se destacam, como a da bipolaridade; não bastam, porém, para constituir uma teoria de conjunto. Classificar as interpretações conforme sua relação com um núcleo central seria correr o risco frequente de forçar-lhes ou de restringir-lhes o sentido, de pressupor o valor principal de um símbolo, de conceder participação excessiva à decisão pessoal. Preferimos, salvo algumas exceções, deixar que os dados brutos conservassem seu peso próprio ou sua polivalência e sua desordem.
A ordem semiológica, por aproximação dos significados, teria, portanto, de ser excluída, a fim de dar livre curso a outras interpretações subjetivas e a fim de respeitar a multiplicidade objetiva dos fatos. Estimamos ser mais frutífero evitar as aproximações sistemáticas, para salvaguardar contradições e problemas.
Da mesma maneira, descartamos a possibilidade de seguir uma ordem histórica no conteúdo dos verbetes. O problema das datas está bem resolvido no que concerne a certos fatos de ordem cultural; quanto a outros, permanece insolúvel.
Qual é a origem do mito de Zeus? E, mesmo quando uma anterioridade está perfeitamente estabelecida, como, por exemplo, a do reino dos faraós sobre a república romana e sobre o império dos incas, seria preciso que nos resguardássemos para não dar a entender que a interpretação dos símbolos depende desse fato estabelecido, e que existe um elo de origem entre os diferentes sentidos.
Pelo menos, é necessário não prejulgar que a afinidade de significados análogos se situe no mesmo nível das relações históricas.
Seria justo, por acaso, colocar a África negra em último lugar pela simples razão de que os documentos — à exceção dos afrescos de Hoggar, por exemplo — não permitem que se remonte no tempo mais de quatro ou cinco séculos?
As tradições árabes perdem-se na noite de tempos, quiçá próximos ou quiçá longínquos, mas que nem sempre somos capazes de fixar. Portanto, uma ordem fundada sobre a cronologia das culturas seria não apenas incerta e frágil, mas também inadaptada à própria natureza dos símbolos.
Isso não significa que não possamos estabelecer relações históricas entre os símbolos e entre certas interpretações. Mas a história das interpretações simbólicas ainda está por ser escrita, e seus dados seguros são ainda em número muito pequeno, salvo, por exemplo, com relação ao simbolismo cristão e sua dependência parcial da Antiguidade greco-romana e do Oriente Próximo e do Oriente Médio antigos.
Nem sistemática nem histórica, a ordem das informações sob cada palavra-chave foi escolhida segundo o princípio que melhor preservasse a autonomia de cada uma delas e a totalidade de seus valores virtuais.
Assim, todos os leitores e todos os especialistas estão livres para chegar a perceber a relação semântica ou histórica entre os dados aqui apresentados.
O conhecimento científico dos símbolos, se porventura vier a existir, dependerá do progresso geral das ciências e, particularmente, do conjunto das ciências humanas. Enquanto esperamos os progressos dessas últimas, adotaremos, portanto, uma ordem puramente prática e empírica, que implique um mínimo de preconceito e que varie de acordo com cada símbolo.
As diferentes interpretações por nós assinaladas para grande número de símbolos não deixam, sem dúvida, de estar relacionadas entre si, tal como os harmônicos em torno de um som fundamental.
Mas o sentido básico não é sempre o mesmo em cada área cultural. É por esse motivo que nos restringimos a maior parte das vezes a justapor várias interpretações, sém tentar uma redução que correria o risco de ser arbitrária.
O leitor seguirá sua própria intuição. Não se trata de cair em outro extremo, que seria o de uma preferência anárquica pela desordem, em detrimento da ordem. Nossa preocupação primordial é unicamente a de preservar todas as riquezas contidas no símbolo, por problemáticas ou contraditórias que sejam.
O pensamento simbólico, segundo nos parece, ao inverso do pensamento científico, procede não pela redução do múltiplo ao uno, mas sim pela desintegração do uno em múltiplo, para melhor perceber — é verdade que numa fração de segundo — a unidade desse múltiplo.
Enquanto não a tivermos aprofundado melhor, parece-nos essencial insistir sobre essa virtualidade desintegradora e, antes de mais nada, salvaguardá-la. Os temas imaginários, aqueles que eu chamaria o desenho ou a figura do símbolo (o leão, o touro, a Lua, o tambor etc.), podem ser universais, intemporais, enraizados nas estruturas da imaginação humana; mas o sentido de cada um deles também pode ser muito diferente, conforme os homens e as sociedades e confor-me sua situação em um dado momento.
Por essa razão é que a interpretação do símbolo, tal como salientamos neste livro a propósito do sonho, deve inspirar-se não apenas na figura, mas em seu movimento, em seu meio cultural e em seu papel particular hic et nunc.
O leão perseguido por um arqueiro, numa cena de caça babilônica, não tem necessariamente o mesmo sentido que o leão das visões de Ezequiel. Procuraremos fazer um esforço para encontrar o matiz, o código próprio e, ao mesmo tempo, o denominador comum.
Cuidaremos, contudo, de não particularizar em excesso, como também de não generalizar com demasiada pressa: dois defeitos de uma racionalização que seria fatal para o símbolo.
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