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O escudo é o símbolo da arma passiva, defensiva, protetora, embora às vezes possa ser também mortal. À sua própria força (como objeto de metal ou de couro), ele associa magicamente forças figuradas. Efetivamente, o escudo é em muitos casos uma representação do universo, como se o guerreiro a usá-lo opusesse o cosmo ao seu adversário, e como se os golpes deste último atingissem muito além do combatente à sua frente e alcançassem a própria realidade representada nos ornatos do broquel (escudo).

 

escudo simbolo de aquiles

O escudo de Aquiles é um singular exemplo disso: "Hefestos (Vulcano) cria nele uma decoração múltipla, fruto de seus sábios pensamentos. Ornamenta-o com figuras da terra, do céu e do mar, do sol infatigável e da Lua cheia, bem como de todos os outros astros que coroam o céu [...]. Também são figuradas duas cidades humanas — duas belas cidades. Numa delas, veem-se núpcias, festins... Em torno da outra cidade, acampam dois exércitos, cujos guerreiros rebrilham sob suas armaduras. Os atacantes hesitam entre duas decisões: a destruição da cidade inteira, ou a partilha de todas as riquezas que guarda dentro de seus muros a aprazível cidade [...]".

Nesse broquel (escudo), Hefestos põe ainda "uma terra branda, um campo fértil [...] domínios reais [...] um vinhedo pesadamente carregado de uvas [...] um rebanho de vacas de chifres altos [...] uma pastagem de cabras [...] uma praça de dança [...] e, por fim, a força pujante do rio Oceano, a formar a beirada do sólido escudo".
Todas as razões de viver, todas as belezas do universo, todos os símbolos da força, da riqueza e da alegria estão mobilizados e concentrados nesse escudo. Esse espantoso espetáculo simboliza também o que está em jogo na batalha: tudo o que se perde ao morrer, tudo o que se ganha ao triunfar. O escudo era grande o bastante para proteger o combatente de cima a baixo e, eventualmente, servir de padiola para carregar um morto ou um ferido.

 

escudo simbolo brasao de armas islandia

Acima: escudo e brasão de armas da Islândia

 

Ao invés de estar ornamentado com cenas sedutoras, apresenta por vezes uma figura apavorante, que é o quanto basta para derrubar o adversário. É a arma psicológica. Perseu vencera a horrenda Medusa sem olhar para ela, porém polindo seu escudo como um espelho; ao ver-se a si própria ali refletida, a Medusa ficou petrificada de horror, e o herói cortou-lhe a cabeça. Foi uma cabeça decepada e horripilante que Atena colocou sobre seu escudo, a fim de gelar de pavor aqueles que porventura ousassem atacá-la.

Na descrição pauliniana da armadura, da qual o cristão deve-se servir para o combate espiritual da salvação, o escudo é a Fé, contra a qual se romperão todas as armas do Maligno. São Paulo diz, mais precisamente, que a Fé extinguirá os dardos inflamados do Maligno; extinguir chamas — o sentido do símbolo dá, aqui, uma significação totalmente espiritual ao papel do escudo da fé, que deve ser usado contra as tentações da heresia, do orgulho e da carne.

 

escudo brasao de armas da irlanda

Acima: escudo e brasão de armas da Irlanda. O Brasão de armas da República da Irlanda é composto por uma harpa com cordas de prata sobre fundo azul. A harpa gaélica já é há muito tempo o símbolo da Irlanda.

 

Um texto irlandês, A Razia das Vacas de Fraech, indica que os escudos (broquéis) dos guerreiros traziam incrustações ou trabalhos de gravação que representavam animais (fantásticos ou fabulosos) servindo de emblema. É um início de heráldica, pois cada herói irlandês parece ter arvorado ornamentações ou emblemas diferentes. Por sua própria natureza, o escudo tem pleno valor apotropaico (isto é, valor de afastar malefícios).

Na literatura medieval irlandesa, ele assumiu acepções metonímicas ou metafóricas numerosas, tais como: guerreiro, proteção, garantia legal etc.

Antes de tudo, o escudo é arma passiva, submissa, como a classe guerreira, ao poder da classe sacerdotal, e não um instrumento de agressão (as línguas célticas não têm nenhuma palavra indígena que designe a couraça.

Encontram-se numerosos exemplos proto-histórícos do escudo circular chanfrado, nas esteias funerárias do sul da França e na Espanha, nas quais ele é o elemento decorativo mais importante, juntamente com o material militar habitual (carro, arco, lança etc).

Na arte renascentista, o escudo é o atributo da virtude da força, da vitória, da suspeita, da castidade. Pode-se apreciar no Louvre um quadro de Mantegna, A vitória da Sabedoria sobre os vícios, no qual Minerva aparece carregando no braço um escudo (broquel) translúcido.

 

O escudo na heráldica moderna

Heráldica é um sistema de identificação visual e simbolismo criado na Europa no século XII, baseado nos brasões de armas ou escudos. O termo também designa a arte de elaborar os brasões e a ciência que estuda suas regras, formas, tradições, simbolismos e significados históricos, políticos, culturais e sociais.

O foco da heráldica moderna é o brasão, ou cota de armas, cujo elemento central é o escudo. É no escudo que se apresentam os principais símbolos identificadores da pessoa, família ou instituição. Também é ele que carrega modificações derivadas de diferentes graus de parentesco, aumentos ou honras adicionais recebidas, e partições derivadas de herança de outras famílias ou casamentos.

Em geral, a forma do escudo empregado num brasão de armas é irrelevante, porque essas formas se modificaram através dos séculos acompanhando a evolução das correntes estéticas dominantes e os usos locais. Mas é claro que há ocasiões em que um brasão especifica um formato particular de escudo. Estas especificações ocorrem principalmente fora do contexto europeu, como no brasão de armas de Nunavut e na antiga República de Bophuthatswana, com o exemplo ainda mais insólito da Dakota do Norte, enquanto o Estado de Connecticut especifica um escudo "rococó".

Tradicionalmente, como as mulheres não iam à guerra, elas não carregavam escudos; em vez disso, as cotas de armas femininas eram ostentadas numa lisonja — um losango apoiado num de seus ângulos agudos. Ainda é desse modo na maior parte do mundo, embora algumas autoridades da Heráldica (como as escocesas, cujas armas femininas são ovais) façam exceções.

No Canadá, a restrição contra mulheres ostentarem armas num escudo foi eliminada. O clero não combatente também fez uso da lisonja e de escudos ovais. São as seguintes as formas tradicionais dos escudos:

  1. Escudo clássico ou francês antigo
  2. Escudo francês moderno, somático ou samnítico
  3. Escudo oval ou do clero
  4. Escudo em losango, feminino ou lisonja
  5. Escudo de torneio ou de bandeira
  6. Escudo italiano ou de cabeça de cavalo
  7. Escudo suíço
  8. Escudo inglês
  9. Escudo alemão
  10. Escudo polaco
  11. Escudo espanhol, ibérico, peninsular, português ou flamengo

 

O escudo, símbolo de segurança e proteção

Como símbolo de segurança e proteção, o escudo já foi usado como símbolo nos desenhos de logotipos de várias marcas de corretoras de seguros e seguradoras.

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Fonte: Livro Dicionário dos Símbolos, por Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, editora J.O.


Página atualizada na Agência EVEF em 25/08/2024 por Everton Ferretti